No mês de maio, Nova Pádua comemorou 103 anos da chegada dos sinos do Campanário da Igreja Matriz. Nossos imigrantes sempre gostaram de sinos, principalmente os vindos do norte da Itália, onde as igrejas possuem um “Campanille” com melodiosos conjuntos de sinos.
Este apego aos sinos continuou entre os seus descendentes que aqui chegando, movidos pela fé, construíram os capitéis, depois as igrejas e as torres com os sinos, os “campanários”.
O registro feito pelo correspondente Benedetto Bigarella ao Jornal Città di Caxias, no mês de maio de 1913, conta que depois de muitos sacrifícios feitos pelo povo, juntamente aos do Pároco Dom Júlio Sacardovelli, chegava à Nova Pádua, da Casa Paocaed, de Savoia – França, um belíssimo concerto de cinco grandes sinos, sendo naquela época, uma grande honra e um verdadeiro tesouro para a paróquia.
Ainda segundo relatos de Bigarella, os visitantes quando chegavam a Nova Pádua ficavam encantados, se comoviam dizendo que sentindo estes sinos remetem-se a aqueles belos concertos deixados lá nas suas cidades de origem, demostrando uma fortíssima saudade.
Antes dos sinos vindos da França, Nova Pádua já contava com um concerto de sinos que foram fundidos em Garibaldi, mas segundo Benedetto, estes não tinham serventia, pois o som era ruim.
Em seu livro, Nova Pádua e sua história, o Pe. Antônio Galiotto destaca que os sinos eram utilizados como meio de comunicação entre as pessoas. Eles comunicavam não só o horário das Missas, mas anunciavam a morte e os enterros dos paroquianos. Adelina Morandi Sonda prestou este serviço braçal durante 20 anos. “O momento de maior emoção foi em 2010, quando toquei os sinos por ocasião do falecimento do Pe. Hilário Piazza”, recorda ela.
Quem nunca escutou dos pais, avós e bisavós a frase “Ascolta le campane che suonano. Andiamo che sono mezzogiorno” (Escuta os sinos que tocam. Vamos que já é meio-dia) quando esses trabalhavam na roça e o toque dos sinos serviam como se fossem um relógio. No final da tarde, os sinos voltavam a ser tocados as 18h:00min, hora da Ave Maria, hora em que nossos imigrantes, tirando o chapéu, e dirigindo-se para suas casas, rezavam suas orações de agradecimento e suas preces de final de dia.
Para o Pároco da Paróquia Santo Antônio, Pe. Mário Pasqual, é uma tradição dos imigrantes tocar os sinos para espantar os temporais, chuvas de pedras e ventos fortes com a frase: “Sonemo le campane par sverder la nuvola” (Tocamos os sinos para abrir a nuvem). “Essa “simpatia” é mais usada nas cidades interioranas”, relata o sacerdote.
Com a chegada do novo concerto de cinco sinos, os velhos foram vendidos por uma “ninharia”, palavra utilizada por Benedetto, só para não ter o desprazer de escutar aquela horrível desarmonia que entediava toda a população.
Conforme pesquisa do Pe. Galiotto, todos os sinos tem um nome, embora não se saiba o porquê da escolha. O “Campanon”, que pesa 1200 quilos, recebeu o nome de Julia Antônia. A tradução de uma das frases em latim presente no sino diz: Louvo o Deus verdadeiro, convoco o povo, e choro os defuntos. O “campanon” é tocado em velórios e sepultamentos; e cada batidas desde sino parece aumentar a dor de familiares e amigos.
O “campanon, (o último e o maior), chegou mais tarde em Nova Pádua, no ano 1926, chegou 13 anos depois dos cinco primeiras sinos, conforme registro feito na Staffetta Riograndese edição de 29 de setembro de 1926, também vindo da fundição do Sr. Paccard. Annecy – de Savoia - França, pois era consenso, inclusive na Itália, que era a melhor fundição de sinos do mundo. A chegada deste sino era de grande expectativa, pois o pároco Dom Júlio, estava muito preocupado, com receio de que o sino tivesse afundado próximo a Porto Alegre, não se sabe se houve noticia ou somente receio, mas o fato que a expectativas da chegada do sino era muito grande.
A música “La Domenica”, de autoria do Maestro da Banda Santa Cecília, Lino Pecatti, faz referência aos sinos em seu refrão:
Senti, senti la campagna,
/Suona forte el campanon
/ presto andaimo ala chiesa
/ Che scomicia le funcion.
A canção representa a religiosidade dos imigrantes que buscaram na fé, a força para vencer as adversidades encontradas na América.
Os outros sinos renderam homenagem aos pais do Pe. Júlio Scardovelli, à Santo Antônio, São Francisco de Assis e ao Papa Pio X. O reverendo Pe. Mário relata que a muitos anos, quando a Igreja Católica escolhia um novo Papa, pedia que todas as igrejas do mundo tocassem os sinos como forma de acolher o novo Pastor da Igreja.
Para Bigarella, não era surpresa se naqueles tempos idos não soubessem fundir bons sinos, porque os fundidores desta região não conheciam ainda o sistema de fundir os sacros bronzes em notas musicais, sistema descoberto nos últimos anos na cidade de Garibaldi (antigamente Conde D’eu).
Adelina lembra que sempre tocou os dois sinos que antecipavam as celebrações na Igreja Matriz. “Quando eram celebradas as missas festivas da paróquia convidava os senhores Vile Bernardi, Domingos Sonda, Aquelino Bernardi, Sabino Bernardi, que trabalhavam como churrasqueiros para me ajudarem a tocar o campanon e mais dois sinos. Sempre consegui pessoas voluntárias, que colaboravam, recordando ainda de Joca Bernardi, Nestor Alessi, Nelso Boniatti, Hugo Boniatti, Nelso Alessi entre outros”, recorda ela.
Benedetto destaca a chegada do progresso nas colônias. “Se fundem um concerto de três, quatro, cinco, seis, sete sinos, em todas as tonalidades, sem poder sequer distinguir a escala diatônica da cromática, isso é uma coisa admirável. Que os agricultores corram para fundir os sinos nos fundidores profissionais para que no futuro se fale mais dos bronzes sagrados de Nova Pádua”, frisa ele em seu texto.
O Pe. Mario explicou que devido ao formato dos sinos do campanário não foi possível que os mesmos funcionassem com o sistema de automatização, com o objetivo de que os sinos toquem nas celebrações litúrgicas e acontecimentos da comunidade paduense de forma automática.
Embora a tecnologia esteja batendo a nossa porta, o Pe. Mário reforça a intenção de que os sinos voltem a ser tocados com cordas como sempre foi feito. “Claro que dependemos de pessoas da comunidade que assumam esse compromisso, mas queremos que essa tradição permaneça viva na vida dos paduenses. Também estamos estudando a possibilidade do campagnon ser tocado durante as procissões entre a mortuária e a igreja matriz no falecimento dos paroquianos”, finalizou ele.
Os sinos tem um significado especial na vida dos paduenses, seja de alegria pelas festas e celebrações que marcam o ano litúrgico da igreja ou nos momentos de tristeza marcados pela perda de pessoas queridas que fizeram parte de nossa vida. Tocar os sinos celebrando a alegria e a tristeza talvez seja o elo musical mais intimo que mantemos com nossos antepassados. Os sinos nos remetem ao passado e ao futuro, sempre nos dando a certeza de que passa o tempo, mas o som que fica em nossos corações é imortal. Talvez por isto que o som do sino chega à alma e desperta emoções.
Por: Maicon Pan